O écran que hipnotisa


“Para um número significativo de pessoas, ver televisão é algo “relaxante”. Observe-se e verá que, quanto mais tempo a sua atenção estiver focada na televisão, mais a sua atividade intelectual se mantém suspensa.
Por longos períodos estará a assistir a programas de entrevistas, jogos, shows de variedades, quadros de humor e até mesmo a anúncios sem que quase nenhum pensamento seja gerado pela sua mente.
Não só deixa de se lembrar dos seus problemas como se torna livre de si mesmo por um tempo – e o que poderia ser mais relaxante do que isso? 

Então ver televisão cria o espaço interior? Será que isso nos faz entrar no estado de presença?
 
Infelizmente, não é o que acontece. Embora a mente possa ficar sem produzir nenhum pensamento por algum tempo, ela permanece ligada à atividade do pensamento do programa que está a ser traasmitido. Mantém-se associada à versão televisiva da mente coletiva e segue absorvendo os seus pensamentos. A sua inatividade é apenas no sentido de que ela não está a gerar pensamentos. No entanto, continua a assimilar os pensamentos e as imagens que chegam ao pequeno ecran. Isso induz um estado passivo semelhante ao transe, que aumenta a suscetibilidade, e não é diferente da hipnose.

É por isso que a televisão se presta à manipulação da “opinião pública”, como é do conhecimento de políticos, de grupos que defendem interesses específicos e de anunciantes – eles gastam fortunas para nos prender no estado de inconsciência receptiva. Querem que os seus pensamentos se tornem nos nossos pensamentos e, em geral, conseguem.
Portanto, quando estamos a ver televisão, a nossa tendência é cair abaixo do nível do pensamento, e não nos posicionarmos acima dele. A TV tem isso em comum com o álcool e com determinadas drogas. Embora ela nos proporcione um pouco de alívio em relação à mente, mais uma vez pagamos um preço alto: a perda da consciência. Assim como as drogas, essa distração tem uma grande capacidade de viciar.
Procuramos o controle remoto para mudar de canal e, em vez disso, vemo-nos a percorrer todos os canais em loop.
Meia hora ou uma hora mais tarde, ainda estamos ali, passeando pelos canais. O botão de desligar é o único que nosso dedo parece incapaz de apertar. Continuamos a olhar para o ecran. Porém, não porque algo significativo tenha chamado a nossa atenção, e sim porque não há nada interessante a ser transmitido. Depois de sermos apanhados, quanto mais trivial e mais sem sentido é o programa, mais intenso se torna nosso vício. Se isso fosse estimulante para o pensamento, motivaria a nossa mente a pensar por si mesma de novo, o que é algo mais consciente e, portanto, preferível a um transe induzido pela televisão. Dessa maneira, a nossa atenção deixaria de ser prisioneira das imagens da TV
.
O conteúdo da programação, caso apresente alguma qualidade, pode até certo ponto neutralizar, e algumas vezes até mesmo desfazer, o efeito hipnótico e entorpecedor da TV. Existem determinados programas que são de uma utilidade extrema para muitas pessoas – mudam a sua vida para melhor, abrem o seu coração, fazem com que se tornem mais conscientes.

Há também algumas atrações humorísticas que acabam por ser espirituais, mesmo que não tenham essa intenção, por mostrarem uma versão caricata da insensatez humana e do ego.
Elas ensinam-nos a não levar nada muito a sério, a permitir um pouco mais de descontração e leveza na nossa vida. E, acima de tudo, ensinam-nos isso enquanto nos fazem rir. O riso tem uma extraordinária capacidade de libertar e curar. Contudo, a maior parte do que é exibido na televisão ainda está nas mãos de pessoas que são totalmente dominadas pelo ego.

Assim, a intenção oculta da TV é de nos controlar deixando-nos num modo sonolento, isto é, deixando-nos inconscientes. Evite assistir a programas e anúncios que o agridam com uma rápida sucessão de imagens que mudam a cada dois ou três segundos ou menos. O hábito de assistir à televisão em excesso e esses programas em particular são duas causas importantes do transtorno de défice de atenção, um distúrbio mental que vem a afetar milhões de crianças em todo o mundo.
A atenção deficiente, de curta duração, torna todos os nossos relacionamentos e percepções superficiais e insatisfatórios. Qualquer coisa que façamos nesse estado, qualquer ação que executemos, carece de qualidade, pois a qualidade requer atenção.
O hábito de ver televisão com frequência e por longos períodos não só nos deixa inconscientes como induz a passividade e drena a nossa energia. Portanto, em vez de assistir à TV ao acaso, escolha os programas que despertam o seu interesse. Enquanto estiver diante dela, procure sentir a vívida atividade dentro do seu corpo – faça isso sempre  que se lembrar. De vez em quando, tome consciência da sua respiração.
Desvie os olhos da TV em intervalos regulares, pois isso evitará que ela monopolize completamente o seu sentido da visão. Não ajuste o volume acima do necessário para que a televisão não o domine também a nível auditivo.
Tire o som durante os intervalos. Procure não dormir logo após desligar o aparelho ou, ainda pior, adormecer com ele ligado.”

Por Eckhart Tolle
O Despertar de Uma Nova Consciência

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